Chegámos por volta da 1h30, era já mesmo o fim de uma sexta-feira que tinha começado bem cedo .
Vínhamos preparados para quatro dias de madorna, de dolce fare niente, de “deixa lá o carnaval para os outros e vamos mas é ficar por aqui a bezerrar. Aproveita-se o fds com o aniversário do afilhado Miguel e da tia Ana Sofia".
Já disse que era 1h30? Pois já.
Chegámos, descarregámos o carro, as três crias incluídas que já dormiam e por uns breves instantes fiquei com a sensação dos finais dos anos 70 e de todos os 80 quando subíamos a Rua Frei Fortunato e nos aproximávamos da Rua Silveira Peixoto, instalava-se uma ansiedade na barriga com a expectativa de ver os mascarados, as matrafonas, tentar descobrir quem fazia de morto no enterro do carnaval e no fds a seguir perceber quem seriam os príncipes e os reis de mais um carnaval.
Já por várias vezes referi que é uma época do ano que me passa completamente ao lado. Provavelmente porque já não estou no bairro e toda a magia ou mística foi-se no tempo.
A sala do VCL cheia à pinha, era um confronto saudável de gerações, a dos nossos pais que até sabiam uns passes de dança e a nossa que se podia dividir em duas partes: a que sabia dançar e a que ficava a puxar o lustre a cadeiras e ombreiras de portas num misto de “não sei dançar, por isso não vou ali para o meio fazer as mesmas figuras do olho de peixe-espada” e “deixa cá ver se a tipa repara que eu estou aqui com os meus sapatos yucca acabadinhos de comprar na Praça do chile e até pus o meu perfume cacharel”. Posso dizer que sempre me incluí nestas duas últimas partes, embora nunca tenha tido sucesso na última.
Claro está que não valia a pena levar sapatos yucca, porque apesar de não dançar era pisado na mesma e o cacharel desaparecia assim que subíamos os primeiros degraus e o cheiro do bacalhau assado e dos chocos com tinta se impregnavam de tal maneira na nossa roupa.
Bom, voltando à sensação de electricidade na barriga, chegámos a casa e o avô Zé, qual matrafona do carnaval do Vitória ou empresária em nome individual e isenta de impostos com domicílio fiscal num carro estacionado entre o Instituto Superior Técnico e o Instituto Nacional de Estatística, esperava pelos netos que acordaram mais depressa que num dia de visita de estudo na escola.
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjkfNvXrchGbWFlIZRA2Z0LCrjXS3AC5LS5nTukjTmFH1ssF3g1Rzd4WtA1FaiqnkkUibTbbhRkFXsFjndFRAYnSMDs1wh4x4s_obXMm9cjLnmICilslJM5beCkiMmkNTVUF2cc/s400/Imagem+038.jpg)
São 77 anos de muitos carnavais.Não sei quantos da minha geração, serão capazes de lá chegar com esta disposição mesmo que a saúde o permita.
Não sei se o Vitória voltará a ter um baile de carnaval. Sei que muitos de nós gostariam de voltar a entrar naquela sala, como se fazia há 20 anos.
Etiquetas: Amizades, Aniversários, Avós, Charneca, Familia, Fotos, Memórias, Picheleira, Putos, Saudosa Lisboa, Sentimentos, Vitória Clube de Lisboa